RIO
— Morreu, por volta de 6h30m da manhã desta quinta-feira, o humorista Jorge
Loredo, o Zé Bonitinho. O comediante, de 89 anos, estava internado no Hospital
São Lucas, na Zona Sul do Rio desde o último 3 de fevereiro, onde permaneceu em
estado grave. As causas ainda não foram informadas.
Topete
esculpido com Gumex, bigode delgado, sobrancelhas arqueadas, olhar de
conquistador e roupas extravagantes, ele mal mal entra em cena e já arranca
gargalhadas da plateia do estúdio da extinta TV Rio, em 1960. Era a estreia de
O Bárbaro, vivido pelo ator e humorista Jorge Loredo no programa “Noites
cariocas”, que serviria de matriz para o personagem Zé Bonitinho, o galenteator
barato e exagerado que marcaria a carreira do artista carioca e a TV
brasileira.
O
Bárbaro foi rebatizado em homenagem a um cozinheiro que Loredo conheceu em um
restaurante de beira de estrada que, por ser muito feio, era chamado de Zé
Bonitinho. Os trejeitos do personagem foram inspirados em outra figura real, o
Jarbas, um dos companheiros do jovem Jorge Loredo nas maratonas pelos bares da
Praça Saens Peña, na Tijuca, onde nasceu.
—
Ele tirava um pentezinho do bolso e ficava ajeitando as sobrancelhas e o
bigodinho toda hora. Se passava uma moça, cantarolava um tango, um bolero...
Fui captando esses trejeitos e criei o personagem — contou.
Autor
de bordões inesquecíveis — “Garotas do meu Brasil varonil: vou dar a vocês um
tostão da minha voz...!”; “Mulheres, atentem para o tilintar das minhas
sobrancelhas”; “O chato não é ser bonito, o chato é ser gostoso”, entre outras
—, Zé Bonitinho foi praticamente uma espécie alter ego de Loredo:
—
Eu sofri com uma osteomielite (inflamação nos ossos) dos 12 aos 46
anos, por isso fui muito mimado. Isso me fez querer ser mimado pelas minhas
mulheres. Era quase um Zé Bonitinho — contou certa vez Loredo que, ainda na
juventude, chegou a ser internado em um sanatório por causa de uma
turberculose.
Os
palhaços estão na origem da vocação de Loredo. Para completar a renda do
marido, dona Luiza, mãe do artista, costurava os figurinos das trupes circenses
que chegavam a Campo Grande, onde a família morava. O ator acreditava que as
fantasias da mãe impregnaram sua retina: já jovem, viu o anúncio dos testes
para a escola de Paschoal Carlos Magno, onde passou depois de ser ensaiado por
Oscarito e Mafra. Estreou interpretando Mercúcio em “Romeu e Julieta” e nunca
mais parou.
Na
TV, o ator começou dividindo o banco do programa “Praça da Alegria”, nos anos
1970, com Chico Anysio, Moacyr Franco e Ronald Golias. Diferentemente de Anysio
e e Franco, que tiveram programa próprio, e de Golias, que era astro absoluto
da “Família Trapo” , Loredo sobreviveu como coadjuvante. O ator chegou a criar
outros tipos famosos, como o mendigo soberbo My Lord e o costureiro François
Paetê, mas Zé Bonitinho sempre foi a sua grande marca, que só desapareceu da TV
quando o programa “A praça é nossa”, do SBT, saiu do ar, no início dos anos
2000.
Longe
da televisão, Loredo chegou a participar de filmes dirigidos por ícones do
cinema nacional, como Rogério Sganzerla (“Sem essa aranha”, de 1970, e “O
abismo”, de 1977) e Arnaldo Jabor (“Tudo bem”, de 1978). Seu último trabalho em
um longa-metragem foi em “Chega de saudade” (2008), de Lais Bodansky. Em quase
todos esses filmes, mesmo que não estivesse interpretando seu personagem mais
famoso, alguns elementos dele, como o vestuário e acessórios vistosos, de
alguma forma estavam sempre presentes nas composições Loredo.
O
artista foi recentemente redescoberto pela geração mais jovem de cineastas
brasileiros. Em 2005, a diretora Susanna Lira lançou o documentário “Câmera,
close!”, uma biografia do ator, exibido no Canal GNT. No ano seguinte, o ator e
diretor Selton Mello, fã do artista, o dirigiu no curta-metragem “Quando o tempo
cair”, para o qual criou um personagem especialmente apra ele. Em 2003, atuou
na peça infantil “Eu e meu guarda-chuva”, a convite da atriz Andrea Beltrão.
O Globo
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